“A coisa tá meia esquisita, doravante ela poderá melhorar se caso for” – Pensava isso o tempo todo naquele tempo, mesmo sabendo que é uma frase altamente maluca. Está na minha essência…

Já havia passado meses desde que eu tinha gastado minha ficha de retirante e estava morando na capital paulista em busca de uma vida melhor. Os caminhoneiros da nação estavam em greve e o espírito da época era caótico. Isso sem falar que o Brasil tinha tomado dois da Bélgica e não disputava mais o hexa. A solidão tinha invadido meu apartamento de 37m2 na Vila Mariana e se recusava a sair. Era uma vida sem mar, sem cachorro, sem família e sem amigos ligando às 14h pra encher o crânio de fumaça entre um freela e outro. São Paulo é foda. Você a ama e a odeia ao mesmo tempo.

E quem me salvou foi o Falcão. O Falcão do girassol. O cantor.

Aconteceu por volta das 22h de uma quinta-feira de junho de 2018. Eu havia saído da aula de quadrinhos do meu querido professor e amigo Octavio Cariello, na Quanta Academia de Artes, e Octavio tinha mencionado rapidamente alguma coisa relacionada ao Falcão. O rei do brega-ostentação e presidente da associação mundial dos cornos fez parte da minha infância com seu grande disco “A Besteira é a Base da Sabedoria”, de 1995, que um tio meu ouvia em loop sem parar, mas passado aqueles anos de ouro, nunca havia revisitado a obra do dito cantor.

Naquele dia insólito de 2018, recém saído da aula, joguei “Falcão” na busca no youtube e me deparei com a canção “Prometo Não Ejacular Na Sua Boca”, do álbum “O Dinheiro não é tudo mas é 100%”. Um título que realmente fisga. Desde os 13 anos, quando ouvi o Nirvana pela primeira vez e soube imediatamente que seria músico, minha vida artística não sofria um impacto tão virulento. Foi naquele instante, ao escutar os versos “supunhetemos que de repentelho/o mundo inteiro se descabaçasse/ora não se ria minha senhora/pois sua filha pode estar aqui dentro” que a semente do retorno ao Nordeste foi plantada no meu coração.

Eu, que me julgava um sujeito desapegado da praia, do chambaril de sábado, do ambiente seccionado entre o apocalipse e o manicômio chamado Olinda e das práticas comuns da pessoa nordestina, tipo comer um queijo coalho ou um cuscuz, percebi como tudo isso sempre fez de mim aquilo que sou: um tabacudão, ávido por arrancar risos das pessoas e leitor do que está escrito nas entrelinhas e se diz sem se dizer. Aí pronto, me fudi.

Um tempo depois, vim ao Recife pra visitar minha mãe, mas acabei pegando o retão da Av. Norte até a descida do Alto Zé do Pinho, onde comprei, em Abílio Percussões Artesanais, uma zabumba e um triângulo acompanhado do meu bróder de sempre, Rodrigo Cm. Saímos de lá, fomos ao estacionamento do Shopping Recife e passamos horas tocando forró aos berros, emudecendo as dondocas e ouriçando os nervos dos barões. Só voltei a São Paulo pra pegar minhas tralhas de volta.


A inteligência da obra do grande Falcon, que é um universo em constante expansão, ambientado entre mente ligeira do nordestino matuto e o espírito intelectual dos homens das capitais, nunca mais me deixou e nem me deixará. E eu escrevi isso aqui porque é possível perceber essa verve humorada e nonsense em todo meu trabalho de Quadrinhos, o que, supostamente, é o foco deste site.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *